O que aprendemos do Rali da Arábia Saudita que fechou a temporada 2025 do Mundial de Ralis?

Em primeiro lugar temos um novo campeão do Mundo, Sebastien Ogier que 12 anos depois do seu primeiro cetro conquistado com a Volkswagen , igualou Sebastien Loeb. Quer isto dizer que os dois “Sebastiões” entre 2004 e 2025 ganharam 18 títulos deixando, apenas, os anos de 2019 (Ott Tanak), 2022 e 2023 (Kalle Rovanpera) e 2024 (Thierry Neuville) para outros pilotos. 

O francês Ogier foi Campeão do Mundo Junior WRC em 2008 com um Citroen C2 na sua época de estreia e com apenas sete provas do Mundial realizadas. Nascido no dia 17 de dezembro de 1983 (a caminho dos 42 anos) cumpriu a sua prova nº100 no WRC no Rali do México de 2016 e conta no seu palmarés com 67 vitórias (33,2%) em 203 ralis realizados. Tem 29 segundos lugares e 18 terceiros lugares num total de 114 pódios, 56,5% dos ralis efetuados. Ganhou 802 provas especiais de classificação (PEC), terminou 172 vezes nos pontos e abandonou apenas 16 vezes em 202 ralis. Ganhou 50 powerstage. 

 

Por outro lado, Ogier venceu o título Júnior WRC em 2008 e foi campeão do Mundo em 2013, 2014, 2015, 2016 (Volkswagen), 2017 e 2018 (Ford M-Sport) e 2020, 2021 e 2025 (Toyota). A primeira vitória no WRC foi no Rali de Portugal de 2010 (há 15 anos), batendo Sebastien Loeb e tendo passado dois dias a limpar a estrada. E foi o primeiro a ganhar um título mundial depois de faltar, deliberadamente, a três provas do Mundial. Sim, é verdade que Loeb ganhou o Mundial de 2006 com uma perna engessada e faltou aos últimos quatro ralis desse ano... mas nessa altura não foi uma ausência forçada e não planeada como a de Ogier.



Em segundo lugar, a prova saudita ficou marcada pelas dificuldades colocadas pelos troços que muitos, com pouco conhecimento de causa, criticaram dizendo que pareciam troços do Dakar. Os pilotos gostaram e adoraram o desafio proposto pela prova aos pneus Hankook que, diga-se, sofreram a bom sofrer com muitos furos. Porém, com os pneus a aguentarem na jante na maioria das situações.


Os mais cínicos podem dizer que ele faltou a todas essas provas para não ser o primeiro na estrada. Porém, Ogier começou o campeonato com menos 105 pontos pelas ausências na Suécia, Quénia e Estónia. Grande campeonato de Ogier, parabéns!



Por outro lado, temos de lembrar Vincent Landais. Ogier, depois de ensaiar Benjamin Vellas para substituir Julien Ingrassia, não gostou e requisitou o navegador de Pierre Louis Loubet. Isto aconteceu em 2022 e dai para cá a relação foi crescendo, e com uma voz que se aproxima à de Ingrassia e um rigor e foco imenso no que faz, Vincent Landais “conquistou” Ogier e conquistou o seu primeiro título mundial. 



Terceiro lugar ficou na retina mais uma exibição de Martins Sesks. O piloto da Letónia provou que com uma boa posição na estrada e talento, o Ford Puma Rally1 ainda pode rivalizar com o Toyota GR Yaris Rally1 e com o Hyundai i20 N Rally 1. Dois furos e um problema mecânico atiraram pela janela uma excelente oportunidade de dar a quarta vitória ao Puma Rally 1 depois de Sebastien Loeb ter ganho o Rali de Monte Carlo de 2022 e Ott Tanak ter vencido o Rali do Chile e o Rali de Portugal em 2023. Ficou água na boca de Richard Millener e de Malcolm Wilson esta participação extra de Sesks que, caso não existam entraves de última hora, estará em 2026 ao volante de um Rally1.


Em quarto lugar tenho de destacar o emotivo final de rali para Kalle Rovanpera e Jonne Haltunen e de Ott Tanak e Martin Jarveoja. O finlandês, duas vezes campeão do Mundo de Ralis em 2022 e 2023, decidiu voltar as costas aos ralis e perseguir uma carreira na velocidade com o foco nos monolugares na tentativa de chagar à Fórrmula 1. Tivemos quem fizesse o caminho inverso... Jonne Haltunnen chorou à chegada do derradeiro controlo e já com a descompressão feita, abraçou Rovanpera e agachou-se junto do GR Yaris chorando compulsivamente. Acreditamos que em 2026 estará de volta com outro jovem piloto...


Quanto a Tanak, mais sóbrio e sem grandes emoções, vai cuidar da família e dos seus negócios e estará de regresso em 2017 para recomeçar tudo de novo e ao volante, quem sabe, de uma bela surpresa...


Finalmente, Thierry Neuville, como sempre, resiliente e nunca se dando por vencido, soubvre aproveitar muito bem os azares e as fragilidades dos seus rivais para impor um ritmo forte e chegar à vitória. Não sem a sua dose de azar e de furos, mas estando, finalmente, satisfeito com o carro e sem pressão, fez uma bela prova recompensada com uma vitória que o impediu de se juntar a Stig Blomqvist e a Richard Burns num recorde pouco positivo de não ter vitórias no ano a seguir a ser campeão.


Olhemos para Elfyn Evans, agora cinco vezes vice-campeão do Mundo de Ralis. Aquela que, apesar de tudo, foi a sua melhor época no Mundial de Ralis – ele que está no WRC desde 2007 tendo já feito 158 provas – não deu frutos. As vitórias na Suécia e no Quénia foram poucas para fazer face a um Ogier que venceu seis das 14 provas do Mundial de 2025. Verdade que nunca abandonou tendo uma inusitada resiliência e consistência, dando que fazer a Ogier. O francês disse no final que “o brilho de um campeão também vem de quem o obriga a lutar e o Elfyn foi corajoso o ano todo e merecia também o título.” Já Evans simplesmente lembrou que Ogier venceu seis ralis na época onde falhou três provas. Portanto inteira justiça no título do francês, até porque o nascido no País de Gales só bateu uma vez Ogier em 11 provas realizadas. E foi devido ao furo de Ogier no Rali da Europa Central...

Adrien Fourmaux é material para campeão do mundo e provou isso na Arábia Saudita. Até quando escolheu mal os pneus para uma das etapas, o francês soube lidar com isso e lutar pela vitória. Furos e, sobretudo, uma penalização de 1 minutos por falta de comunicação assertiva da equipa com Alexandre Coria e um comissário que não sabia as regras, levou-os a penalizar um minuto por avanço. Não tivesse isso sucedido e estaríamos a falar da primeira vitória de Fourmaux e Coria e um recorde negativo para Thierry Neuville. Ainda assim ficou a melhor classificação de sempre no WRC com o segundo lugar, numa saborosa dobradinha para a Hyundai depois de um ano em que andaram “atrás da bola” e com muitas dificuldades operacionais. Não quer dizer nada esta vitória para o ano que aí vem, mas pelo menos o Hyundai mostra que ainda tem competitividade e em termos de moral deu uma grande ajuda aos comandados por Cyril Abitboul.

 

Antevê-se uma luta bem interessante entre Sami Pajari e Oliver Solberg... liberto das amarras que o prenderam durante todo o ano, o finlandês deu um ar da sua graça no Japão – no asfalto onde ainda precisa de evoluir – e chegou, pela primeira vez, à liderança de um rali do Mundial na Arábia Saudita. Um furo e um pneu delaminado acabaram com as sua esperanças de vencer pela primeira vez.

 

Porém, Sami Pajari tem recuperado a aura que o levou até à equipa oficial Toyota, depois do soco nos dentes que foi a vitória de Oliver Solberg à primeira com um GR Yaris Rally1.

 

Finalmente, há um rali que rivaliza com Acrópole, Safari e Portugal em termos de dureza. Muito diferente daquelas provas, a Arábia Saudita é muito dura para as suspensões, transmissões e pneus. O carro sofre muito e os pneus também, pelo que não espanta que todos tenham conhecido problemas com as borrachas da Hankook.

 

Fica aberta a discussão se este deverá ser o rali de final de temporada, ou não, na eventualidade, como sucedeu este ano, de termos o título decidido, apenas, na derradeira jornada do campeonato.

 

Dust and Done como dizem os britânicos, a temporada de 2025 foi muitíssimo interessante e tivemos luta até final. 

 

Últimas notas: ficou evidente que a escolha de pilotos por parte da M-Sport não foi a melhor, mas apenas a possível pela necessidade de ter pilotos pagantes para sustentar a presença na competição. Estranha que Josh McErlean ainda não tenha o lugar seguro, depois dele e da equipa dizerem que havia contrato para 2026. Sabem o que isto quer dizer? Depois explicamos, mas há novidades ao virar da esquina e talvez permitam que o Mundial em 2026 tenha mais... animação!

 

A Hyundai deverá ter aprendido a lição e terá muito mais cuidado em 2026 na abordagem ao Mundial de Ralis. Chegar á reunião anual de balanço com uma vitória na mão é melhor que recordar a miséria que foi a participação no Rali Islas Canarias. Falta de preparação e demasiados recursos a pensar no WEC e no projeto do Genesis teria de cobrar a fatura. Andrew Wheatley vai assumir as rédeas da equipa - embora tenha sido estranho ser François Xavier Demaison a falar com a comunicação social – e já disse que quer ganhar. Veremos...

 

Enfim, foi um ano intenso onde a vossa presença no acompanhamento das provas foi essencial. Muito obrigado a todos, muito obrigado ao David Pacheco e a todos os técnicos da Sport TV pela camaradagem e apoio ao longo de 2025. Esperamos ver-nos já em janeiro no Rali de Monte Carlo!

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