terça-feira, 16 de maio de 2023

Sabe por que razão os pilotos de ralis usam tanto os travões?

Sabe porque razão, os pilotos usam tanto o travão? Certamente que nas transmissões dos troços do Mundial de Ralis os menos conhecedores interrogaram-se por que razão as luzes de travagem passam a vida a acender e apagar. Há uma razão para isso e eu explico.

A disciplina “Ralis” difere da “Velocidade” porque não são provas disputadas em ambientes diferentes, com formatos dispares e com estilos de condução diversos. 

Por definição, “ralis” são provas de velocidade compostas por provas especiais de classificação disputadas em pisos diversos (terra e as suas muitas variantes e asfalto) e numa superfície que está sempre a mudar. 

Para a “velocidade”, a definição refere provas de velocidade realizadas em circuitos fechados (sejam circuitos, autódromos ou rampas) com determinado número de voltas (ou subidas) sempre no mesmo traçado.

Se na “velocidade” a trajetória, a velocidade em curva e a travagem nos locais certos determina o tempo por volta, devendo evitar-se o mais possível andar de lado, nos “ralis” a coisa é bem diferente.

Sabe porque razão nos ralis disputados em superfícies dinâmicas e com características que podem mudar quase metro a metro, a técnica de condução é diversa? E que a antecipação, leitura do terreno, excelentes notas de andamento e improvisação perante as adversidades, são fundamentais?

Se na “velocidade” o tempo por volta será melhor dependendo do tempo que consegue andar de acelerador a fundo e da velocidade que pode levar para dentro das curvas, nos “ralis” não é bem assim.

Num circuito de alcatrão a aderência é maior e com os pneus “slick” as forças centrífugas geradas são massivas. As leis da física são os únicos obstáculos para a máquina e para o piloto.

Por isso se diz que andamos tão depressa quanto a aderência e a tração que o carro consegue encontrar. Não raro vemos os pilotos a dizer que “não tinha tração” ou “a pista está escorregadia, não havia 'grip' nenhum” ou ainda “estava muito escorregadio”. Tudo sinais de que a aderência não estava lá e os pilotos conheceram dificuldades em andar depressa.

Ou seja, andamos tão depressa quando a aderência que existe no terreno que o veículo pisa. E os pneus são, sempre, fundamentais. Por isso quanto maior for a adesão dos pneus à superfície maior será a capacidade de aceleração, mudança de direção e travagem.

Sabe porque razão não custa muito perceber que numa pista há muita aderência, num troço de um rali essa aderência é menor e, pior que isso, muda constantemente, pois não? Dai que muitas vezes, particularmente nos pisos de terra, dizemos que os carros “esgravatam” por tração. Como é que se pode contrariar esta situação?

A transferência de massas é um conceito que é essencial para encontrar mais aderência, logo mais tração, evidentemente, mais velocidade. E o que nos diz este conceito?

Sabe porque razão quando trava o seu carro com decisão, a frente mergulha e a massa do veículo dirige-se para a frente? Experimente isto: pegue num carrinho de brincar, coloque um lápis no seu caminho e atire-o de encontro ao lápis. Verá que quando ele embater há uma imobilização do movimento e verá a traseira a levantar. Estará na presença de uma transferência de massa!

Apliquemos isto à sua condução. O que é mais complicado: subir uma colina ou descer uma colina? Vai dizer a subida. Errado! É a descida, porque a massa estará concentrada na frente e com esse peso o eixo dianteiro terá mais aderência, pois os pneus estão mais comprimidos contra a estrada.

Quando aceleramos, o efeito é o contrário, ou seja, a massa vem para a traseira – quando acelera a fundo não sente a frente a levantar? É a transferência de massas! – a frente perde precisão da direção e as rodas traseiras tem mais aderência.

Se o peso estiver na frente, pode mudar de direção muito mais facilmente, porque há mais aderência, se tiver o peso na traseira, o carro seguirá a direito, mas a direção será imprecisa e o eixo dianteiro terá pouca aderência.

Como é que podemos aplicar este conceito na condução nos ralis? Simples: usando os travões!

Com o princípio da transferência de massas em mente, responda: acha que conseguirá entrar numa curva em piso de alcatrão se estiver ainda a acelerar? E se fizer o mesmo exercício, mas em cima de um piso de terra? Pode virar o volante, mas com a massa na traseira, o eixo dianteiro não terá aderência e o mais certo é seguir em frente. O clássico fenómeno de subviragem em que o carro sai de frente.

Sabe porque razão é preciso contrariar essa situação? E como o fazer? Primeiro para ter aderência. Assim, para contrariar esta situação temos de usar os pedais do acelerador e do travão. Imagine a cena: vai num estradão de terra a acelerar e aproxima-se uma curva, roda o volante e... nada! O carro alarga a trajetória e sujeita-se, dependendo da velocidade a sair rumo ao cenário. E se travar a fundo, piora a coisa.

O que deve fazer é simples: antes da curva – e se conseguir dominar a técnica de travagem com o pé esquerdo, melhor! – trave e faça a massa atirar-se para a frente. O eixo dianteiro fica pesado, ganha aderência e a direção responde aos seus comandos. Claro, a traseira fica solta e começa a deslizar. Quanto mais tempo conseguir manter a massa no eixo dianteiro com uma pressão constante nos travões, mais depressa o carro é capaz de curvar e assim que estiver a ver a saída da curva e hora de voltar ao acelerador e transferir a massa para o eixo traseiro.

Este ganha aderência, endireita o escorregar da traseira – controlado pela contrabrecagem  - e sai disparado, mas com menor controlo da frente. Mas já estamos a direito e em reta, portanto não há problema. Na próxima curva, o processo é o mesmo. 

Porém terá de perceber algumas coisas. Quanto maior a velocidade, maior terá de ser a sua reação à sobreviragem e maior o perigo de sair de estrada. O trabalho entre os travões, o acelerador e a direção tem de estar bem coordenado para evitar longas derivas – que só fazem perder tempo – ou violentos sacões que podem leva-lo a perder o controlo do carro. Obviamente que se dominar a travagem de pé esquerdo e a aceleração, poderá "sacar" belos "powerslides". Mas com cuidado para não passar a fazer parte do cenário!

Enfim, o segredo está em usar os travões para fazer a frente mergulhar, carregar os pneus da frente com mais aderência, esperar até chegar ao ponto em que pode regressar ao acelerador. Sempre que necessitar de controlar uma deriva excessiva, o acelerador é o seu melhor amigo. Para curvar depressa, são os travões o seu melhor amigo. 

Percebe, agora, porque é que os carros de ralis estão sempre com as luzes de travagem acesas? Experimente na próxima prova do Mundial relacionar as luzes com a atitude em curva do carro. E percebe que quando um piloto atravessa mais o carro... é porque exagerou na velocidade e precisa de anular esse excesso. Andando de lado, em demasia, reduz a velocidade... mas perde tempo. Mas por outro lado, aumenta sobremaneira o espetáculo!

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